Viajar não é só torrar no sol, comer bem e bater perna: é principalmente ouvir histórias. E a história de um lugar que conheci no Espírito Santo me tocou demais: a Casa de Pedra. Esse não é só um post sobre uma dica de passeio, é também a história do seu Neusso, que construiu a própria casa e o ateliê em que trabalha com pedras.
Visitei a chamada Vila das Artes com o pessoal do Pocando no ES –um encontro de blogueiros de viagem convidados para conhecer lugares diferentes do Espírito Santo, garimpar dicas de viagem e trocar ideias. É lá que fica a Casa de Pedra e, na frente, o ateliê de Neusso Ribeiro.
Quando você chega na Casa de Pedra, você não sabe bem o que vai encontrar lá dentro. Perde uns minutos tentando entender como ela está em pé, de que forma foi construída.
Na sala, várias esculturas de madeira impressionam. No meio deste cômodo, um grande tronco tem as marcas de onde um dia estiveram uns degraus, que levam para uma espécie de “puxadinho” superior –ali era o quarto. Os degraus foram tirados porque crianças subiam sem a supervisão dos pais e poderia ser perigoso, já que a “escada improvisada dá em uma passarela suspensa até o quarto, O local tem ainda um banheiro e uma cozinha, tudo construído com muito capricho pelo seu Neusso.
Ele nos contou que veio do Vale do Jequitinhonha (nasceu em Mucurici, no norte do ES), criado em uma família de 15 irmãos, todos na roça –“um lugar muito sofrido”, segundo ele, “Lá, as pessoas mexem muito com cerâmica, e todo mundo sabe fazer algumas coisas porque é preciso se virar para sobreviver”, diz. Nos 28 anos em que ele está em Jacaraípe (um bairro no município de Serra), mais artistas e artesãos mudaram para os arredores da Casa de Pedra, e o grupo chegou até a criar uma associação.
“Eu não tinha recurso para fazer mais nada. Eu imaginava que a casa ia ser somente uns paredões e um telhado”, conta o seu Neusso. Ele lembra que a primeira coisa que construiu foi a parede da frente da casa, onde instalou uma porta. “As pessoas passavam pela rua e achavam que era uma casa, mas era só um paredão de 3m”, diz o artista, rindo ao lembrar do começo da construção. Ele lembra ainda dos que passavam na casa e diziam “essa casa vai cair”. “A casa está aqui há 28 anos, muita casa por aí já caiu e aqui ainda está em pé!”, diz, super orgulhoso. “E já passou por altas tempestades”.
Ele nos falou ainda sobre a dificuldade para construir o telhado, já que “os casqueiros” queimavam as cascas que ele precisava para a cobertura da casa –em vez de doar para ele. O seu Neusso ainda tentou convencer o dono do material, um italiano, a doar o material, e a resposta foi “não, os empregados vão querer pegar também”. O tal italiano só mudou de ideia quando a construção da casa saiu no jornal da região –e ele leu sobre o local. “Aí ele mandou um caminhão de casca, mandou os empregados dele me trazer tudo”, relembra.
Hoje ele vive das peças que vende e trabalha com decoração de algumas residências. E hoje ele não mora mais na Casa de Pedra. Conseguiu um dinheirinho e vive em uma casinha em uma terra que comprou, Tem até “uma lagoa” no fundo, segundo ele.
A casa está aberta para visitação todos os dias. Você paga uma entrada simbólica, e pode tirar quantas fotos quiser. Se der sorte, o seu Neusso estará lá –ele diz que tenta ficar na casa todos os dias– e poderá contar algumas histórias para você também. Ela fica na R. Daldson da Rocha Barros, bairro São Francisco.